sábado, 20 de outubro de 2012

Da Maria

Dizem que eu sofro dos nervo,
Mas, acho que não sofro não.
Sofro com as dificuldade da vida,
Talvez com a falta de pão.
Minha barriga tá assim grande,
Deve de ser de ar,
Que de comida num é não.

Vim me embora pra essa terra de pau de arara
E seis fio na mão.
Não queria tá aqui...
Só tô, porque é de precisão.

Nessa hora o doutô oio pro relógio,
Me oio meio de lado e preguntô:
"Qué atestado?"

He..hehe...
Não escrivinho nem meu nome,
Por isso que às vezes passo fome,
Ninguém da emprego pra quem só usa a mão.
Sinhô qué me dá atestado?
Me dá de sobrevivência.
Que de trabaio, não carece não.

Ele escreveu engarranchado,
Dava nem pra entendê as letra...
Me entregô o papel todo amassado,
Me enxotô feito cão:
"Vai te embora muié, de fome tu não morre não.
É filho que tu carrega no bucho.
Se cuida e cuida da alimentação".

Não sei se chorava de tristeza ou de agonia.
Mas, cada lágrima que caía,
Sabia que tinha muito de alegria.

Fui me embora de pé no chão,
Lenço na cabeça
E os seis fio na mão.
Cresceram os sete,
Depois mais um, mais um, mais um, mais um...
Cada ano que passava, mais um eu paria.
Até que a vida me tomou um e menos um, menos um...

Dos que vingaram, sabia que doutô não viraria,
Mas sendo filho de Maria,
Ia crescer na vida
Ia dar tudo que tinha pra poder dividir o pão.
Sabia, que mesmo sem diploma nem alforria,
Ia ter bom coração.


*Baseado nas histórias das 3 Marias da minha vida;Maria Iolanda, Maria Vieira e Maria da Cruz.
Uma, deu vida ao meu pai,
Outra, deu a luz à minha mãe.
Outra, deu a vida à minha mãe.